Um passarinho interrompeu a música de Claúdio Nucci na primeira edição do Projeto Quinta 8:30h dos produtores Nelson Freitas e Silvério Lazaroni no hoje saudoso Esporte Clube Iguaçu acho que em 1990.
Este passarinho era um bailarino esquálido e tão ágil quanto estático. Um misto de bacurau (insistentes gorjeios noturnos), gato (contorcionismo e de astuta malemolência), anjo e demônio (suas feições teriam em mim naquela mesma noite os dois aspectos convivendo em harmonias sincopadas).
Sempre esbarrava com este poeta fortuitamente em momentos inesperados como devem ser encontros incandescentes.
Noutra feita, novamente num Quinta 8:30h – já no Teatro Procópio Ferreira, dentro do Colégio Afrânio Peixoto – fora proibida sua entrada. Não se proíbe a entrada de seres como Dejair Esteves. Evoca-se tempestade! Provoca-se vulcão! É melhor! Mas barrar um “dejair” jamais! Você estará despertando imensuráveis efeitos colaterais.
Mas, serpente prevendo o bote, esperou. O show era de Lô Borges, que interpelado - ainda na entrada - pelo simpático e franzino (quase meigo) sujeito, pedindo autógrafo e contando-lhe haver sido barrado, disse: “Você será meu convidado esta noite”. Triunfou! Deu para a gente ainda ver suas asinhas baterem excitadas no mesmo ritmo em que sua cauda - em forma de seta - sacolejava. Arrependido depois deve ter ficado o mineiro quando o passarinho cantou como nunca durante todo o show!
Grande poeta, gentil amigo quando não é detestável. Provocação é seu cognome. Questionar de forma não convencional, o mundo, seu papel. Não que cumpra ou siga um script, suas emoções do dia ditam suas ações. Você não sabe como o encontrará. Pacífico, super protetor. Demoníaco, auto-destrutivo.
Dejair Esteves é assim, imprevisível. Ou previsível até demais. É a dicotomia encarnada. Poderia gastar todo o celulóide virtual desta máquina e ainda assim teria histórias frescas para contar. Por isso vou deixar vocês com algumas dessas fábulas contadas por pessoas que as presenciaram. Roubadas de um tópico criado pelo cineasta Fábio Branco na Comunidade do Dejair no Orkut. Simbora:
Ele Não Largava o Osso
“Eram os últimos dias do bar do Daniel (uma das referências culturais da cidade). Faltava só um fim de semana para ser fechado e o performático lunático poeta das ruas tomou de assalto um caminhão de carne e pegou a parte traseira da carcaça de um boi, ainda com articulações. Eu não sei o nome exato, só sei que aquela ossada parecia uma gaita de fole. Era grande demais! Dejair adentrou com aquela estranha coisa e aí os senhores imaginem o alvoroço que foi... Dejair merece todo o meu respeito como escritor e grande amigo."
Naldo Calazans (Preguinho – Poeta e Animador Cultural)
Acha Que é Desenho Animado...
“Uma vez meu pai estava sentado na rua e viu uma carroça passando. Aí perguntou quem queria apostar que ele conseguiria correr e pular dentro da carroça - do desconhecido - EM MOVIMENTO. Claro que ninguém acreditou e apostou... Ele mesmo assim, tomou distância e saiu correndo, só que a carroça estava perpendicular a ele, nem preciso dizer né? Claro que ele pulou alto demais e caiu do outro lado, todo ralado e como se não bastasse o dono da carroça - achando que ele iria assaltá-lo, saiu correndo atrás dele para bater... Que figura!"
Pris Negra (Filha)
Dejair e o Robalo.
“Década de 80. Ali, onde hoje funciona o "camelódromo" de Nova Iguaçu. Aquele que começa em frente ao IERP e vai até a rua de pedestres, funcionava, antes, uma rodoviária, a Arruda Negreiros, de linhas de ônibus municipais. No meio dela existiam três ou quatro barzinhos quem ficavam 24 horas open. A turma da boemia, antenada a movimentos culturais, vez por outra assistia ao nascer do sol, acotovelada a um desses balcões. Numa dessas estadas, Dejair, assíduo no point quando em grupo, notou o movimento matutino de abastecimento do mercado de peixes, comum ali, devido à grande concentração de peixarias. No passa-passa de caixas de peixes, Dejair identificou uma caixa passando cheia de robalos. No mesmo instante disse: “Vou roubá-lo!”. Sumiu do grupo por minutos e quando o caminhão se retirou, ele voltou com um embrulho de jornal de baixo do braço. Lá estava o robalo reluzindo ao abrir o embrulho. Todos do grupo ficaram atônitos com a mirabolância do Dejair. Quanto ao peixe, ele passou a fazer parte momentânea do balcão do bar. Num pequeno espaço entre a beirada da pedra mármore e a estufa de salgadinhos, o que não demorou muito para incomodar pelo cheiro e pelo acúmulo de moscas, provocando a expulsão de todo o grupo dos “virados” da noite naquele dia."
Moduan Matus. (ainda tem mais um monte de histórias!)
Guarda Meu Chinelo aí!
“Certa vez, uma segunda-feira, estava eu dentro do ônibus da viação Brasinha (Nova Iguaçu/Jardim Tropical) voltando do trabalho, cansado e me curando da ressaca do fim de semana. Ônibus cheio e eu em pé olhando despreocupado a rua. Quando o ônibus parou em um ponto ali na Califórnia, perto do Chico Móveis (ou Bosh, não me lembro bem o que era na época) vi Dejair parado no ponto perturbando alguém. De repente me viu e pediu para eu descer, no que negativamente sinalizei, informando que estava cansado e de ressaca. Ele me ordenou que descesse ou iria invadir o busão e me tirar de lá. Todos já me olhavam e preferi sucumbir. Descendo eu - puto - disse que não iria beber e tal. E ele: "Eu vou rapidinho ali em casa e volto, só vou mudar de roupa e a gente bebe uma cervejinha só" e eu: "Se você, sair eu vou embora!" aí ele para me segurar, tirou seus chinelos Riders e disse: "Fica aí tomando conta" e saiu correndo descalço... Porra, peguei os chinelos dele e fiquei lá esperando. Passado um tempo voltou o Deja lindão. Elegantérrimo. Eu entreguei os chinelos para ele, no que ele me indagou: "O que é isso?" e eu "Teus chinelos, ora!" e ele me deixando mais puto ainda pegou e jogou-os no lixo. "Acabei de achá-los". Porra, só de raiva, bebemos até de manhã...”
Cézar Ray (Eu)
Novo Rio
“Eu e Angelúcia nos anos 80 estávamos indo para Friburgo e sem saber os horários dos ônibus. Chegamos na rodoviária à noite e só teria ônibus pela manhã. Jogamos as mochilas no chão e nos preparamos para passarmos uma péssima noite. Eis que aparece uma surpresa!! Sabe quem também chegou por lá?? Dejair Esteves!!! Puta merda! Foi uma noite daquelas! Bebemos todas, Dejair cantou, dançou "poetou" e encantou a todos que estavam por perto! Ah sim, ele também encheu o saco de muita gente. O início da viagem foi a melhor parte dela, pela inusitada presença do Dejair!!!”
Denise Pio (viajante)
Barrado... Não para Poesia
“Tenho muito respeito por esse poeta... Lembrei quando vi a foto de um fato que guardo com muito carinho. Daniel's Bar lotado, não sei por qual motivo o Daniel não deixava o Dejair entrar no bar. O grupo de poesia do qual ele fazia parte, não me lembro se era o Desmaio Públiko ou o Caco de Vidro, foi chamado ao palco. Alguns poetas recitaram e chegou a hora do Dejair. Ele não pensou duas vezes, num pinote subiu ao muro pelo lado de fora e numa pose emblemática começou a vociferar um poema de improviso: "Fiz poesia para as praças, e nada... Fiz poesia para os bares, e nada...", e continuou um poema-protesto que infelizmente não lembro completamente, uma pena, pois foi um dos melhores poemas que já ouvi recitado.”
Marcelo Bizar (Tecnólogo, humanista e sambista)