segunda-feira, 3 de setembro de 2012

DMV – Fagner 10 Anos



A angústia do mundo, aliada ao costume de se trabalhar com palavras, faz com que as oportunidades de exercitar as idéias num texto, acabem em confissões públicas. E não é diferente com o DMV. Às vezes uso a paciência de vocês para despressurizar o meu coração.

O DMV desta quinzena versa sobre um disco, para a minha vida, paradoxal demais: ao mesmo tempo especial e um tanto difícil porque me remete de forma direta à lembrança do meu pai, já que foi este o presente dele em algum longínquo Dia dos Pais. Talvez seja o único disco que eu e ele ouvimos juntos algum dia, na mesma sintonia. E lembro desse dia feito se fosse hoje: tarde de domingo, sala, e ele já meio chapado a elogiar a canção Años que o Fagner canta em parceria de Mercedes Sosa. Lembro da expressão dele com os olhos rasos d’água, feito os meus agora. Que saudades de você, meu velho...

Pois que este DMV continua a navegar nos mares das coletâneas e elege o disco comemorativo Fagner – 10 anos, Columbia, 1984. Um disco comemorativo presume-se de sucessos e este não é diferente. Os maiores destaques da carreira de Fagner até 1983 estão neste disco realmente fabuloso.

Antes de falar especificamente sobre o disco em questão, permitam-me comentar algo que faz do Fagner alguém muito especial: ele coloca música em poemas. Vários poemas já foram musicados por Fagner de maneira brilhante, pois ele o preserva integralmente, sem modificá-lo uma vírgula sequer. São vários os exemplos: o primeiro se tornou logo o maior sucesso da carreira dele, Canteiros, poema de Cecília Meireles em 1973. Depois voltou a musicar Cecília em Epigrama nº. 9, no disco Orós de 1977. Continuou em Cecília e seu lindíssimo Motivo, no disco Eu Canto de 1978. Em 1980 musicou Fanatismo, poema da portuguesa Florbela Espanca e Traduzir-se de Ferreira Gullar, que também batizou o disco. Em 1982, logo dois de Florbela: Fumo e Tortura. Em 1983, Me Leva de Ferreira Gullar. Além do raro hábito de ler poemas, Fagner os reconstruiu por meio da música de maneira competente. É muito difícil, digo com experiência própria, esse negócio de musicar coisas prontas. Difícil demais. O que acontece muito em parcerias é a liberdade que o letrista dá para que pequenas modificações sejam feitas ao longo da composição. Mas o nosso Fagner não podia fazer isso, não é mesmo?

A primeira música já diz ao que o disco veio: Revelação, de Clodo e Clésio, é uma daquelas músicas inesquecíveis que juntaram Fagner e Robertinho do Recife (onde andas, Robertinho?). Eternas Ondas, de Zé Ramalho, se tornou um clássico do Fagner. Depois seguimos com Años, As Rosas Não Falam (Cartola), Pensamentos, Joana Francesa (Chico Buarque), Mucuripe, Fanatismo, Noturno (uma das canções mais bonitas que o Fagner gravou de outros compositores), Traduzir-se e Último Pau de Arara. Um disco, enfim, de grandes sucessos que não registra a obra grandiosa do Fagner, mas que dá uma excelente pincelada.

Tenho a impressão que este disco, ao ouvi-lo, com 13/14 anos, abriu outras possibilidades na minha formação musical. Um disco comemorativo, porém denso, de muita qualidade. Coincidência ou não (não é), este disco sintetiza um divisor de águas na carreira do nosso Fagner. Na minha opinião, após esta comemoração, pouco fez e pouco acrescentou à sua rica discografia.

Fagner, Fagner mesmo é este aí. A maioria do que virá adiante são deslizes, apenas deslizes de um cara genial feito ele. Fagner é um dos grandes da MPB.

Quem não ouviu, ouça. No volume máximo. No poema máximo.

Quer conhecer o disco, baixe aqui:

Marlos Degani: Poeta e cronista. Amigo explosivo. Acabou de voltar de Buenos Aires cheio de histórias para contar. DMV é mais uma cria deste incomparável e inquieto artista!

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