terça-feira, 28 de junho de 2011

Edição XI

Bem vindos a Edição Onze. Aqui em Recife, os últimos dias foram de festas. O São João é a mais esperada de Pernambuco. Fiz festas em meu apê, mas ao invés de ser em volta de uma fogueira, foi em volta do Wii. Ao invés do forró, o Rock’n’Roll comeu solto. Em vez de quentão, geladas. No lugar de comidinhas a base de milho, kitão do Habib’s. Foi assim e digo, foi bom!

Bom também está este número do Zarayland, chega aê:

- Na Agenda Zarayland convido vocês para o aniversário de cinco anos do Cineclube Buraco do Getúlio sábado, domingo para o projeto Levando a Vida Assim de Penna Firme e dia 20 para o IV EnContos vs PE: A Última da Mesa.

- Falo um bocadinho de Heraldo HB e de seu livro Engenharia de Aviãozinho, com direito a um poema dele no fim.

- A Coluna de Marlos Degani, DMV, versa sobre um discaço que gosto muito: O Estrangeiro de Caetano Veloso. Deixo um linkezinho lá para quem não conhece a obra ainda, conhecer.

- Recife Frio, o filme de Kleber Mendonça Filho é meu filme da vez. Um documentário fictício que vale a pena procurar. Vejam a cena do Papai Noel que deixei aí e imaginem só o resto.

- Coluna MEU POVO com o poeta Euclides Amaral. Um cara que norteou muito do que faço. De brinde ele declamando um poema de Paulo César Pinheiro.
E é isso!

Um beijo um queijo e um beliscão de caranguejo!

Cézar Ray

Agenda Zarayland

CINECLUBE BURACO DO GETÚLIO: 05 ANOS!
Dia 02 de julho no Espaço Cultural Sylvio Monteiro o Cineclube Buraco do Getúlio comemora seus cinco anos de serviços prestados ao cinema e a comunhão entre pessoas do bem. Festa com certeza imperdível. Um beijo em BiOn e Luana! Um beijo em Flor e Abílio! Um beijo em Jimmy, Mixo, Drica! Um beijo em Peregrino, Batata, Adonis, China! Um beijo para a galera que acompanha o Buraco desde os primórdios lá no Bar do Ananias até hoje!
As intervenções da festa prometem: Poeme-se!, Let’s Pense, Charanga do Caneco, Gente Estranha no Jardim, Banda Cretina e Spllash!! Meia década comemorada em alto estilo. Se der mole pego um vôo e apareço. Simbora!?

Espaço Cultural Sylvio Monteiro
Rua Getúlio Vargas, 51 – Centro – Nova Iguaçu – RJ
(Em frente a Estação Ferroviária de Nova Iguaçu)
Tel.: (21) 2667.2157

IV EnCONTOS vs PE no BANQUETE: A ÚLTIMA DA MESA
Acontecerá no dia 20 de julho a quarta edição do EnContos. No Bar Banquete em Santo Amaro, Rua do Lima, Recife. O tema é o seguinte: A Última da Mesa. Ou O Último da Mesa.

Por quê?
Já repararam que quando pedimos uma porção de petisco em algum bar / restaurante, assim que chega a guloseima é um ataque! Mas sempre sobra a última ou o último pedaço no prato. Ninguém quer pegar a última da mesa, não sei se por vergonha (pois todos estão de olho naquele último pedaço), não sei se por educação: "Ah, deixarei para outro que esteja com mais vontade ou fome". Só sei que fica lá, as vezes, até o garçom levar. Próximo Tema: A ÚLTIMA DA MESA ou O ÚLTIMO DA MESA.

Quem quiser participar, é só chegar a partir das 19h. Quem quiser ser publicado no jornalzinho, envie o conto até o dia 18 de julho para meu email: cezarray@hotmail.com
Até lá!

Bar e Restaurante Banquete
Rua do Lima, 195 – Santo Amaro - Recife – RJ
(ao lado da Igreja e em frente à TV Jornal)
Tel.: (81) 3423.9427


LEVANDO A VIDA ASSIM: PENNA FIRME convida
Domingão agora, dia 03 de julho, Penna Firme convida vocês para o evento LEVANDO A VIDA ASSIM. Numa versão semi-acústica, o músico apresentará as canções de seu primeiro disco de mesmo nome e receberá Djs, Vjs, compositores, cantores para mostrar seus trabalhos e falarem como estão levando a vida. Além de suas músicas, Penna interpretará grandes compositores da MPB. O Horário é bacaninha, começa as 18h e vai até as 22h. Vamonessa!?

Convidado da semana: René Rossano

Luna Café Des Arts
Rua Cosme Velho, 564 - Cosme Velho - Rio de Janeiro – RJ
(Entre o Museu de Artes Naïf e a Estação dos bondinhos do Corcovado)
Tel.: (21) 3268.4678



Engenharia de Aviãozinho – HB

Minha amiga Rogéria Freitas abriu uma livraria super aconchegante ali na Getúlio Vargas em 2000 com seu sócio Rafael Quirino, quase em frente onde hoje em dia é o Espaço Sylvio Monteiro em Nova Iguaçu. Infelizmente meses depois, faliu. Uma pena. Mas enquanto estava aberta, fizemos uns bons barulhos por lá.

Numa ocasião criamos um projetinho pequenininho como era a livraria. Eu iria declamar uns poemas, André Eira montou um trio de violões para cantar músicas de Radiohead, Pixies, Cake com carinha acústica e tal. Todo mundo sentadinho, cervejinha de leve, petisquinhos light.

Quando cheguei no espaço, um cabeludo veio falar comigo. Na verdade veio me perguntar se eu era o Cézar Ray. Apresentou-se: “Sou Heraldo Bezerra”. Ainda não era o HB. Contou-me que era de Caxias e que tinha ido especialmente naquele evento conhecer a galera do Desmaio Públiko, que já conhecia somente pelo fanzine, disseminado gentilmente pelo poeta Euclides Amaral em suas investidas à Duque de Caxias.

Anos se passaram, Heraldo virou HB, um dos fundadores do Cineclube Mate com Angu (referência em cineclube nacional), fundou o portal Baixada On e é um dos maiores agitadores culturais do Rio de Janeiro. Ícone em Caxias e em Nova Iguaçu, lançou seu primeiro livro Engenharia de Aviãzinho no final de 2009. Tive o privilégio de receber o livro em minha casa aqui em Recife via Correios, autografado e com uma dedicatória toda especial para o Desmaio Públiko que me emocionou deveras.

Engenharia de Aviãozinho é uma antologia dos poemas de HB. Tem sabor de coletânea. Em seus poemas se percebe a clara influência que sofreu de poetas da geração maldita e de poetas do subúrbio como Euclides Amaral, Genêsis Jenúncio, Eud Pestana entre tantos. Quem fez HB começar a escrever foi Quintana e dele herdou as imagens doces que freqüentam vários poemas, o outro responsável, Rubem Fonseca deixou seus poemas com cara de cinema. E é isso, um monte de referências jogadas num liquidificador e servido com cachaça.

A preocupação do livro é a Não Preocupação. É poesia. E isto é muito em tempos de poses e falta de honestidade em ser você mesmo. Engenharia de Aviãozinho é Baixada Fluminense, mas poderia ser também Paris, Bruxelas ou Recife. É HB. São poemas de um homem de verdade sem firulas e sem máscaras.

Resumindo, virei fã de um cara que era meu fã. Hoje tenho HB como um espelho das coisas boas que a cultura e arte podem oferecer ao mundo. Fico feliz em apresentar este poeta que representa muito o espírito do Desmaio Públiko. E que foi muito, mas muito além! Salve Poeta!

Aprender o mar é preciso.
No seu mistério sem palavras
No conspirar das suas ondas...
Quiçá mirá-lo até o êxtase
E Depois, embriagado de azul,
Afogar o medo
Em toda sua imensidão.

Heraldo HB

Recife Frio – Kleber Mendonça Filho

A primeira pessoa que me falou sobre este filme foi o BiOn! Um dos cabeças do Cineclube Buraco do Getúlio - que completa 05 anos, sábado dia 02 de julho de 2011 – quando esteve em minha casa aqui em Recife com Belão (parceiro que se interessou em fazer um filme sobre o Desmaio Públiko). Mas demorei para encontrar o curta. Na verdade não havia disponibilidade no Youtube, como hoje, e nem o DVD físico para ser comprado.

Meses se passaram e li uma matéria elogiosa sobre o filme, e que ele estava à venda na Livraria Cultura por R$ 12,00. Fui lá, mas havia esgotado. Encomendei e dois dias depois o adquiri.

Já sabia do que se tratava, porém fiquei impressionado com a qualidade da película (que na verdade, acho, é digital).

Ele, o filme, é um documentário fake sobre um Recife frio. Narrado por um correspondente internacional de uma TV hispânica. Conta o que aconteceu com a capital do frevo depois que sua temperatura tropical, com variações pequenas, nunca abaixo de 23 graus, de uma hora para outra cai a menos de 14 graus.

Como Recife se transforma, desde seus repentistas até investidores estrangeiros em pousadas das praias paradisíacas que acabam se fudendo pelo novo clima frio. Desde um Papai Noel que sofria com o calor em pleno dezembro até famílias de classe média alta que, com seus apartamentos ventilados a beira mar, ficam a mercê do frio inesperado.

O filme de mais ou menos 30 minutos é interessantíssimo em todas as suas nuances. Do efeito de fumacinha saindo das bocas dos entrevistados, a Avenida Boa Viagem cheia de placas de vende-se em seus prédios imponentes, ou dos artesanatos adaptados para o novo clima.

Mas o curta, além de divertido, é tenso, crítico. Kleber Mendonça dosa bem momentos hilários com denúncias sobre a verticalização e desumanização da cidade, bem antes ainda da mudança climática.

Impagável Lia de Itamaracá cantando uma ciranda para um grupo de cirandeiros de cachecol, touca, luva e sobretudo.

O curta ganhou diversos prêmios pelo Brasil e pelo mundo, não a toa. Ele é um petardo lisérgico de um diretor visionário. Recife Frio é um filme para quem vive em Recife e conhece seus aspectos peculiares. Mas também para todos de qualquer cidade que gostem de cinema bem feito, seja ele uma ficção, um documentário ou ainda um híbrido fantástico. Procurem, vale a pena a busca.

Assita a cena do Papai Noel aqui:

Meu Povo: Euclides Amaral

Lembro-me de Eud Pestana fazendo a capa de um livro chamado Cynema Bárbaro, seu autor Euclides Amaral. Perguntei ao Eud quem era ele, e o sacaninha disse “É um padre. Um padre amigo meu”. Acreditei nisso por um bom tempo.

Ouvia sempre Vavá (Eud) conversar com um amigo que ele chamava de Kibe. Mas não sabia que Kibe, era Euclides Amaral e que Euclides Amaral não era um padre, mas um poeta fodaço! Soube disso quando fui apresentado ao livro “Balaio de Serpentes” de 1984. Um dos livros que pirou meu cabeção. Com este livrinho que era divido em duas partes, poemas e letras de músicas eu descobri mais sobre a possibilidade do poema do que com todos os clássicos que havia lido antes.

Para mim era um livro Rock’n’Roll. Poemas punks. Anárquicos. Tinha muito a ver com aquele moleque de 18 anos que queria ter uma banda de Punk Rock e que acabara de se descobrir poeta.

Pouco tempo depois fui apresentado ao Amaral e viramos amigos. Dormia algumas vezes em sua casa na Penha onde elel me mostrava músicas, vídeos de eventos que havia organizado, declamava poemas novos e ensinava-me como colocar letra numa música (coisa que nunca aprendi). Amaral me influenciou muito em vários setores.

De uma generosidade imensa, nada egoísta, vivia me dando livros, discos, fanzines e jornais. Eu ficava boquiaberto com o seu grau de desprendimento com as coisas materiais. E foi exatamente isso que ele fez quando lançamos o Desmaio Públiko. Nunca ficou com uma cópia. Distribuía as suas e mais, xerocava como um agente multiplicador.

Outra coisa bacana é vê-lo declamando, porque constantemente traz uma novidade. Lembro-me de uma apresentação que ele dividiu com o poeta Chacal no Teatro do BNDS, em que ele entrou por trás do público, cercado por bexigas (balões) vermelhas e veio estourando uma a uma e declamando um poema até chegar ao palco. Ou quando enchia uma sacola com poemas em forma de aviãzinhos e jogava para o público. Chamava-as de gaivotas. Ou quando declamava o poema do gato e do rato, em que trazia dois bonecos dos referidos animais, um em cada mão. Amaral é um performer e tanto.

Além de poeta é contista, letrista, produtor musical e pesquisador da MPB, trabalhou arduamente na confecção de verbetes de vários artistas de vários gêneros para Dicionário Cravo Albin da MPB. Escreveu um ensaio sobre a poesia na Baixada Fluminense, que conta um pouco da minha história, intitulado Centauros da Poesia.Tem vários livros publicados, produziu as coletâneas Conexão Carioca, dando voz a vários músicos e intérpretes. Assim como Marlos Degani, tem uma coluna fixa no site Baixada Fácil. Amaral é um cara do caral!

domingo, 19 de junho de 2011

EDIÇÃO DEZ

Não sei vocês, mas eu estava com uma saudade danada do Zarayland. Meu amigo André Luz me visitou esses dias, Marinaldo Imperiano também. Foram dias etílicos! Pensem num desmantê-lo! Esta é a Edição DEZ! Criei mais uma nova seção: 10 Perguntas Para... e como é uma edição comemorativa, ao invés de cinco textos, coloquei mais um de lambuja. São eles:

Chico Science – Escrevi um texto sobre um ídolo que me influenciou em muitas coisas, inclusive vir para Recife.
 
10 Perguntas Para... – Estréia com o DJ 440 daqui de Olinda – PE

Cerveja Filosófica – Mato a saudade deste evento que acontecia no Bar Raízes

Meu Povo – Desta vez duplo, com dois irmãos / poetas de Nova Iguaçu: Jr. Blue e Alcides Eloy

DMV – Marlos Degani (nosso colunista) indica mais um disco de sua vida, desta vez Luz de Djavan (de quem nem sou fã)

Seu Antônio – Outro textinho nostálgico sobre um dos bares mais querido que Nova Iguaçu já teve.

E é isso tudo. É leitura por uns dias!

Um beijo, um queijo e um beliscão de caranguejo!

Chico Science I

Minha primeira impressão de Chico Science & Nação Zumbi foi de total estranhamento. E olha que eu li muito a respeito do som que eles faziam, antes mesmo de ter acesso ao primeiro disco da banda. Na verdade, antes mesmo de ouvir uma única música da banda.

Era início de 1993 e a revista voltada ao rock (existia a Rock Press também) era a BIZZ (ok, pop rock) e através de minha irmã Cláudia (mais velha que eu) pude acompanhar desde o número zero. Com ela (a revista) conheci tudo que sempre me foi muito caro para o resto de minha formação musical. Ali eu li e depois comprei discos de bandas como Echo and The Bunnymen, DeFalla, The Smiths, The Cure, Felline, The Cult, Colarinhos Caóticos, PIL, Black Future, Picassos Falsos entre algumas bandas fodaças dos anos 80.

Quando os anos 90 chegaram, as bandas que faziam rock ou eram em inglês - emulando o som da época (bandas fantásticas, aliás), ou bandas já consagradas, recriando suas fórmulas, hora felizes, hora trágicas... foi uma época – para mim – ruim.

Comecei a frenquentar o Daniel’s Bar exatamente quando os anos 80 acabaram e meu pai teve um derrame. Era um bar onde tínhamos a possibilidades de conhecer música, porém somente ao que convencionou-se ser chamada de MPB. Conheci muito do que se fazia e o que tinha sido criado nesta vertente, anos antes. Comecei também a frequentar amigos que passaram a ter importância prioritária em minha vida. E todos eles só curtiam MPB e Samba.

Mas sei lá, sempre correu em minhas veias o Rock’n’Roll e não consegui ao todo abandonar minhas origens malditas. Eud Pestana já havia me apresentado aos Mutantes, André Eira ao Pixies, Moduan Matus ao Premê, Blue e Alcides Eloy ao Arrigo Barnabé... mas eu queria mais. Queria ter uma banda para mim, como foi a Legião Urbana em 1985 ou o DeFalla em 1987. Queria alguma coisa que me fizesse respirar desesperadamente. E veio o programa do Maurício Valadares no início dos anos 90, chamado RONCA RONCA.

Trabalhava com um jornalista chamado Celso Reader e ele era fã do programa de MauVal e me gravava fitas do mesmo, que era transmitido pela Fluminense FM e que na minha casa - no Jardim Ulisses - não pegava, ou quando pegava, tinha mais ruídos que conversa de bêbado.

Numa dessas fitas havia uma banda chamada Jorge Cabeleira, da qual fiquei fascinado. Era rock pesado com sotaque nordestino. Rock’n” Roll pela primeira vez tupiniquim, Dali ouvi Raimundos, outra pedrada nacional pesada. Uma turma desafiando o mercado com cultura nacional e som pesado. E nas leituras estavam lá Chico Science e Nação Zumbi, Mundo Livre S.A... e eu precisava conhecer isso.

Numa tarde num passeio pelo shopping Rio Sul, com minhas irmãs, entrei na loja Hi-Fi e perguntei a atendente: “Tem Jorge Cabeleira? Tem Chico Science (que eu falava Cience) e Mundo Livre?” Tinha dois, o primeiro e o segundo. Comprei. Alucinado, não via a hora de chagar em casa para ouvi-los. Mas só fui escutar no dia seguinte.

De cara, Jorge Cabeleira me provou que o aperitivo do Ronca Ronca era tudo que eu achava novidade na música nacional. Ouvi Chico e achei estranho... Hip Hop demais, batucada que não me era familiar. Muito estranho. Jorge Cabeleira, não. Rock e forró, Rock e Alceu, Rock e Gonzagão, Rock e Zé Ramalho. Este era o som. Mas não desisti de Chico. Gravei uma fitinha com as duas bandas e passei a ir trabalhar ouvindo aquilo. De um lado o Som de Jorge e do outro a estranheza da Nação Zumbi.

Não esperava que o mangue boy dominaria, não só a minha preferência como a minha vida. Aquilo era NOVO de verdade. Nunca havia ouvido Maracatu. Nuca tinha ouvido coco, embolada, ciranda, e nem ouvido versos do Hip Hop com frases tão esquisitas como as que ouvi ali. Gírias, sotaque e um dialeto quase indecifrável.

Não mais consegui ser o mesmo. Alguma coisa mudou em mim. Queria saber de onde vinha aquilo, porque era assim. E dali passei a pesquisar sobre toda a cultura pernambucana como um fanático. E com isso aprendi tantas coisas que sou incapaz de relatar aqui.

Posso dizer que por conta disso passei a ouvir música de raiz nordestina (sem mistura) passei a ouvir samba, passei a ouvi Hip Hop, música eletrônica e muito mais. Chico abriu tantas possibilidades como ninguém nunca havia aberto em toda a minha vida. Da poesia a postura. Do cinema a moda.

Chico foi um divisor de águas para mim como nenhuma banda (nem a mais punk de todas) pode ser. E até hoje ninguém conseguiu chegar perto.

E se moro em Recife, muito desta história tem a ver com Chico Science & Nação Zumbi. E tenho tanto ainda para falar sobre isso que deixo para uma segunda oportunidade, muito breve, mas é melhor deixar para depois...

10 Perguntas para: DJ 440

Conheci o DJ 440 lendo na Veja Recife que rolava em Olinda o “Terça do Vinil” e fui conferir. Lá – eu, chato para carai – fiquei incomodando o DJ para que ele colocasse a música que eu queria, mas o artista de personalidade não sede, nem quando o que se pede é bom. E por isso gostei dele.

Depois fiquei sabendo do projeto Vinil e Outras Cozinhas no Bar Burburinho e comecei a bater cartão por lá. Virei amigo e fã de 440. Sua gentileza me permitiu colocar uns sons na noite, mas segundo ele, eu sou um DJ “Pata de Elefante”, pela violência com que tratava suas agulhas e seus raros vinis, tão bem cuidados.

Ele é uma das figuras mais dinâmicas hoje em Pernambuco. Atento ao que rola de novo, cuidadoso com o que parece velho, mas que é o que há de mais moderno. Simpático e disponível, sem estrelismo, como um artista que sabe de sua importância para a música nacional.

Certa vez, no Rio, fui numa daquelas antigas lojas da Sete de Setembro e comprei uns cinco discos raros para presenteá-lo. Só um do Martinho da Vila ele não tinha. Mas ainda assim ele está com uns 20 discos meus. Quer devolver, mas quase não deixo.

Terça-feira (14.06) levei meu bróda André Luz para conhecê-lo. Foi festa. Ainda comprei 5 molduras para vinis, feitas por ele, que coloquei hoje em minha sala já querendo mais 15.

Escolhi com cuidado o camarada que iria estreiar esta nova coluna do Zarayland. Com vocês DJ 440:

DJ 440, por que 440?
Uns pensam que é o número da minha casa..., mas sonhei com esse número quando criança... mais ou menos 9 anos de idade. É uma coisa boa, mas no sonho, diziam para eu nunca dizer do que se trata...

O que mais te influenciou como DJ e Produtor?
Amor a música. Sem amor a gente não escolheria uma pá de carreiras dessas da vida. Viver como DJ no Brasil não é fácil, ainda mais nadando contra a maré, como é o meu trabalho.

Qual o vinil que você mais procura e que se alguém - por acaso - tiver em casa perdido ou esquecido e quiser presenteá-lo você adoraria?
Cara, eu procuro há anos o LP do pernambucano DI MELO, e o LP do NORIEL VILELA. Dificílimos de achar. Mas os dois do Tim Maia Racional, já ficaria feliz.

Qual foi a importância do Movimento Manguebeat para você?
O movimento Manguebeat fez o mundo olhar com mais força pra Pernambuco no âmbito musical. Depois dele as pessoas perceberam que aqui não tem só praia e tapioca. E sim, muitos músicos de talento e uma riqueza cultural única.

Que novos artistas você indica para que os leitores do Zarayland saiam a caça?
Tenho ouvido muito o som do Burro Morto, banda de João Pessoa e o disco novo da banda pernambucana Comunidade Azougue. Ah, também estou apaixonadíssimo pelo disco da Anelis Assumpção, filha do nosso glorioso Itamar Assumpção.

Que artistas antigos você indica para que os leitores do Zarayland saiam a caça?
Recomendo o som do Osmar Milito, Moacyr Santos e o disco Sadao Watanabe Meets Brazilian Friends (1968). Coisa fina!

Com o blog SOM BARATO você sofreu com a perseguição à disponibilização de músicas de graça na rede. O que mais doeu quando foi obrigado a tirá-lo do ar?
Eu não sou dono do Som Barato. Algumas pessoas pensam isso, não sei por quê. Fui apenas um assíduo colaborador do blog, que logo mais, deve voltar ao ar.

Como nasceu o projeto do mixtape NORDESTE INDEPENDENTE?
A idéia é mostrar um pouco da produção musical nordestina ou com elementos da cultura nordestina. Sob um olhar mais contemporâneo, passeando desde o tradicional forró de rabeca até uma versão eletrônica com samplers de Jackson do Pandeiro. Apresentar também ao mundo artistas que o próprio nordeste desconhece.

Terça do Vinil continua bombando na Bodega do Véio em Olinda, mas você não sente falta de um projeto semanal em Recife como era o Vinil e Outras Cozinhas?
Em Olinda o clima de boemia é mais forte. Os boêmios são de fato praticantes. Acho que é por isso que ha mais de 3 anos a Terça do Vinil é um sucesso. Tenho saudades, sim, de fazer o projeto em Recife, mas é difícil arrumar uma casa que abrace a idéia de verdade, como a “Bodega” abraçou. O empresário quer que o projeto seja um sucesso desde a primeira noite. Não pensam que o projeto é uma construção! Deve ser por isso que a noite do Recife vai mal, muito mal.

Você é um camarada que não para! O que vem por aí?
Recentemente lancei virtualmente a coletânea Nordeste Independente, logo mais sairá em disco físico com apoio da Red Bull Music Academy Radio e da CD MIX (Recife). Outra coisa que com que estou muito feliz, é a possibilidade de até 2012, lançar uma coletânea de musica pernambucana compilada por mim, prensada pela GZ Digital, fábrica de LPs da República Tcheca.

Obrigado ao blog Zarayland pelo espaço. Quem quiser ter mais informações sobre o meu trabalho, pode acessar o meu site: http://www.dj440.com.br/ tem de tudo por lá. Mixtapes para download, fotos, vídeos, agenda, além do acesso à redes sociais. Compareçam!

Cerveja Filosófica

Não comecei este movimento. Demorei um tempo para embarcar nesta empreitada de Lafayette Suzano. Qual era proposta? Reunir um grupo de amigos no Bar Raízes e discutir filosofia. Filosofia é foda! Mas Alcides Eloy me convenceu a ir. Entendam, não é que eu não viaje em filosofia. É que filosofia é foda!

O lance era parecido com os EnContos (embora tenha acontecido muito antes deste). Um tema era escolhido numa semana e na seguinte, todos se encontravam com todas as defesas sobre tal idéia. Lafa anotava ou gravava toda a discussão e levava ou um dicionário ou um livro que desse a definição do tema e o pau comia!

Lembro-me bem da minha primeira reunião com o grupo. Não me recordo dos presentes, mas do tema sim: Os Novos Mitos. Fiquei espantado como a filosofia pode ser discutida com prazer ao lado de uma cerveja gelada e com gargalhadas e discursos ponderados e tantas vezes poéticos.

Só da minha primeira vez, foram amenas trocas de perspectivas. Em todas as outras vezes, o bicho pegava. Cerol fino. Não me esqueço das discussões sem fim entre André Eira e Jussara Freire. Não me esqueço de dedos em riste de Liriam Tabosa e de Mauro Almeida. Não me esqueço da cara de felicidade do Lafayette Suzano assistindo – e sempre com opiniões contundentes – o que exatamente ele queria. Porradaria.

Foram noites e noites de visões pessoais sobre: ética, amor, morte, solidão, sexo, loucura entre outros que disputavam tapa a tapa a noite com as estrelas. Sócarates, Aristóteles, Descartes, Tomás de Aquino, Bacon, Platão faziam festas no éter enquanto temas que nem mais me lembro, nunca chegavam a qualquer conclusão. Existe coisa melhor? Começávamos as 20h e íamos noite adentro.

Acho eu, que a única vez que chegamos a um senso comum, foi quando discutimos – numa noite quente – Deus. E depois de tantas imagens e descobertas matrixssianas, chegamos a um consenso: “Deus existe! Nós é que não existimos!” E foi uma gargalhada de felicidade! (ainda que a Felicidade, tenhamos discutido numa outra ocasião sem chegar a um veredicto). Quanto nos faz falta isso... Filosofar. Nem que seja, na mesa de um bar, como apenas mais uma desculpa para sair, encontrar amigos e beber.

Meu Povo - Jr Blue & Alcides Eloy

Falar dos poetas JR Blue e Alcides Eloy é meio que contar minha historia. Fomos criados no mesmo bairro. Aliás, o “Bairro” é um aglutinado de bairros ali perto da Dutra. Entre o Jardim Tropical e o Posto 13. Jardim Ulisses, Margaridas, Monte Líbano formavam este pequeno país onde éramos reis e súditos. Minha rua – por exemplo – era a síntese desta geografia. De um lado da rua (no meu trecho) era Jardim Ulisses, do outro lado, já era Margaridas, passando o valão era o Monte Líbano e passando da curva da padaria já era sei lá...Posto 13, Manhoso...

Ali connheci Blue. Na época Fernandinho. Lobinho (escoteiro) óclinho na cara, irmão de Janete, Shirley e Verônica e Hugo. Coincidentemente eu também tenho 3 irmãs. Angela, Cláudia e Luciana só não tive irmão. Mas não foi isso que nos aproximou, e sim a Igreja Católica onde freqüentávamos o catecismo.

Eloy nesta época, mais velho e evangélico, não fazia parte de nossa história.

Fizemos Primeira Comunhão juntos e depois cada um tomou seu rumo. Tínhamos só 8 anos, sei lá, e só voltamos a nos encontrar aos 19, 20 anos. E foi aí que nos conhecemos de verdade.

Lembro-me de ter uns 14 anos e dançava numa quadrilha junina da Rua Bento Lima e enquanto dançava reparei na tatuagem de um cara que bebia e assistia nossa performance: era Alcides Eloy, seis ou sete anos mais velho que eu, já era um adulto e eu um moleque. Mas também só fui conhecê-lo de verdade anos mais tarde quando reencontrei Blue.

Estava na Casa de Cultura com Moduan Matus assitindo a um filme e chegaram os dois encharcados por uma torrencial chuva que caía. Ali começamos a falar sobre poesia, música, mulheres entre outros assuntos que se estenderam durante a noite.

Viramos um trio que não se desgrudava. Formamos o Grupo de Poetas Decúbito Dorsal, declamávamos poemas em todos os cantos que nos chamavam. Centro Cultural Donana, Teatro do DCE da UFF, Centro Cultural Guerreiros Unidos, Beer Beatles Bar, foram alguns dos lugares que me lembro. Fazíamos performances e piadas para nós mesmos. Passávamos tardes bebendo, ouvindo Pink Floyd e fazendo planos.

Viajamos para Visconde de Mauá e dividimos a mesma barraca e a mesma lata de salsicha. Mas esta é uma história que um dia ainda conto todinha aqui. Foram tantas histórias que vivemos juntos que o espaço é curto para serem contadas de uma só vez.

Somos amigos até hoje a pesar da distância. Eu morando aqui em Recife, Blue em Nova Iguaçu e Alcides Eloy em Cabo Frio. A poesia sempre nos regeu e o amor guiou nossos passos. Tenho orgulho em ser irmão desses dois poetas! Titirititiu!

BOA VIAGEM ao meu brother

Quando o Poeta
Parte para longe
Ficamos todos meio tontos

Como se fosse
Um furacão passando
e a gente rodopiando
Rodopiando...

Jr Blue

*

Sou um pinheiro
Solitário
No alto de uma colina
A espera
Da tempestade
Que se aproxima.

Alcides Eloy


DMV – Luz - Djavan

O DMV desta quinzena versa sobre um dos discos mais impressionantes no que diz respeito à exuberância criativa de um artista: O Luz, LP de Djavan, 1982, CBS.

Gravado em Los Angeles, produzido por Ronnie Foster, Luz é o quinto disco de Djavan e representa uma enxurrada de canções que marcaram a carreira do cantor/compositor e também da música brasileira. Luz é composto de dez canções e simplesmente oito sucessos: Pétala, Açaí, Sina, Esfinge, Capim, Luz, Nobreza e Samurai. É a musicalidade de Djavan adicionada à tecnologia que Gil já utilizara em Realce, lançado em 1979, com orquestração de primeiro mundo e tecnologia de ponta.

Luz é um disco sofisticado e mais África, digamos assim, do que o Realce. Como sempre defendeu o nosso Roberto Lara, Djavan é todo musical e nada poético. De fato, a maioria das letras dele é ininteligível: Açaí, zum de besouro um imã... Mas, por outro lado, a pegada rítmica, o suingue e riqueza melódica são de arrepiar. Tanto é que Djavan é um dos artistas brasileiros mais gravados no exterior.

Samurai conta com a participação de Stevie Wonder na harmônica. Wonder dispensa maiores apresentações. Trata-se de um dos maiores músicos do mundo. E fez de Samurai uma música do planeta.

Luz é um disco divino. São poucos assim. Pouquíssimos, aliás. Há discos especiais e magníficos pelo conceito original de composição e podem ser considerados indispensáveis; Luz é indispensável musicalmente e tem um quê de simplicidade não simplória que arrebata os mais carrascos críticos. Amo Nobreza, amo Samurai, amo Sina, amo Esfinge, amo Pétala, enfim, amo Luz, o disco.

Se não ouviu, ouça. Se não amou, ame.

Marlos Degani é o colunista fixo da coluna DMV (Discos da Minha Vida).
Seu blog é: http://www.sanguedapalavra.blogspot.com/


O Bar do Seu Antônio

Foi assim. A pizzaria Abracadabra em Nova Iguaçu estava lotada. Fomos para o Jeitão da Baiana, mas estava cheio também. Era fim de ano. A rua lotada. Entre os dois bares boêmios, uma lanchonete chamada Cantinho da Gegê. Vazia. Um senhor com cara de poucos amigos no balcão espantava os mosquitos.

Mas o que importava isso para sedentos como nós? Nós? Eu, Marinaldo Imperiano e Ana Oliveira, que queríamos mais era cerveja gelada e ver o movimento da Rua Floresta Miranda. Pedimos ao senhor (Seu Antônio) uma cerveja, que ao contrário dos outros bares, por estar vazio, estava geladíssima! Pedimos um petisco, meia porção de filé com fritas. Meu irmão, que meia porção era aquela? Era imensa!!

Começamos a frequentar lá todos os dias. Acontece uma coisa curiosa com nossos amigos. Podemos nunca ir a um bar, mas se tem um de nós lá dentro bebendo, vamos parando. E chega um e chega outro e adotamos o bar para a gente. E foi isso que aconteceu com o Cantinho da Gegê, que logo passou a ser conhecido – só - como Seu Antônio.

Ao contrário do que parecia, o português de sotaque carregado, Seu Antônio era uma simpatia de pessoa. Ele e Dona Sônia, sua esposa e seu filho Luiz Vascaíno sempre foram muito receptivos aos novos frequentadores, que de uma hora para outra, lotaram a pequena lanchonete.

A macarronada do bar ficou famosa e virou prato da matilha esfomeada. O bolo de cenoura com chocolate, a gente comprava no final da noite a um precinho simbólico e levava para o café da manhã do dia que já quase chegava. Nas vitrines do balcão, docinhos, tortas, pudins, afinal era uma lanchonete que acabou virando um dos bares mais badalados da cidade.

Seu Antônio era de uma franqueza que conquistava todos nós. Lembro-me de uma vez que fiquei uns quinze dias sem aparecer por lá. Quando cheguei, ele veio todo simpático dizendo: “Cézar Ray, você está sumido!!” e eu: “Estava viajando, Seu Antônio. Estava com saudades de mim?” no que ele sem pestanejar mandou: “E eu lá sinto saudades de homem? Eu estava com saudade do seu dinheiro”. Gênio!

O bar fez tanto sucesso, e o ponto ficou tão atraente que Seu Antônio começou a receber propostas de empresários do ramo para vendê-lo. E por mais que torcêssemos por um bom negócio para ele, ficaríamos muito tristes se isso acontecesse. Mas aconteceu. Menos mal. Seu Antônio vendeu o bar para um amigo nosso, Flavinho, músico e entusiasta das artes que mantém o bar até hoje. Com o nome de Estação Floresta. Reformado, com área para shows, grade na varandinha. Som de primeira.

Mas cá entre nós sinto falta daquela lanchonete onde entrava para beijar a cabeça de Seu Antônio que me colocava para correr. Daquelas mesinhas no meio da rua. Em ajudá-lo a guardar as mesas e cadeiras na hora de fechar. E muita, muita saudade do Seu Antônio e de Dona Sônia. Muitas saudade mesmo!

quarta-feira, 8 de junho de 2011

EDIÇÃO ESPECIAL EnCONTOS vs PE II

Eu já havia proclamado que não iria publicar os contos do nosso fantástico EnContos aqui. Mas porque não? Foram tantas cartas. Emails. Gente gritando lá na rua. Porque não? Este espaço foi criado para eu poder publicar tudo que gosto. Não quero criar polêmicas. Não quero fazer graça. Quero mostrar ao mundo ou para quem se interessar o que me faz feliz. O que me fez feliz. Ou o que vai me fazer feliz. Ou sei lá, o que me toca de alguma forma. E estou cercado de tanta gente boa. Que fico espantado por ser tão privilegiado assim. Então taí. Edição Especial II EnContos vs PE.

O texto de Bruno Piffardini não está aqui, e olha que ele fechou com chave de ouro, fazendo toda a mesa gargalhar até dar dor de barriga, porque ele é que nem o Willian Sertório do EnContos de Nova Iguaçu. Esceve no punho, sem digitar, sem enviar, sem me mandar. Mas foi foda!

Registrar também a presença de Thiago Guerra, Kaio, Rafael Sete, Siglia, Salomão e Jéssica que tornaram tudo mais saboroso com suas presenças participativas em atenção, sorrisos, lágrimas e vozes para os textos de quem não pode ir. Obrigado!

O Sr. Bruno Piffardini deu o tema para nosso próximo EnContos: “O que acontece em Governador Valadares, fica em Governador Valadares”! Simbora. Enquanto isso lá em Nova Iguaçu o bicho tá pegando também... o último foi ótimo: “Da cadeira do engraxate”. Vamos escrever minha gente.
Um beijo um queijo e um beliscão de caranguejo!

Zaray
Em contagem regressiva para a edição 10!

Cadê DeniZSe?

Ele se aproximou, ela levantou os olhos. Bonito ele. Do tipo inacessível.
- Denize?
- Não.
- Seu nome não é Denize?
- Não. É Denise com “s”.
Ele fez para ela um olhar de quem estranha. Estranhamente lindo era ele.
- E como pode saber se o Denise que falei é com Z ou com S?
Ela sorriu inteligente.
- Pelo jeito que falou...
- Que jeito?
- As Denises com “S” são mais soltas, safas, sinceras... As com “z”...
- O que tem?
- Zombeteiras...
- “Zacanas”?- Ele murmurou. Ela fingiu não entender.
Ela voltou a arrumar livros. Estavam numa biblioteca.
Tinha anos que ela procurava o amor da sua vida. Mas como não achara, resolveu estudar biblioteconomia que acabou por ocupar seu coração.
Mas era uma mulher portanto curiosa.
- E porque procura Denize?
- A cartomante disse ser o amor da minha vida.
- Mas ela disse com “z”?
- Não... Jogou as cartas e murmurou... Deni... Ze ou Se.
Ela conhecia a cartomante. Havia passado por lá uma vez. Um homem surgiria, o grande amor de sua vida. Cézar.
- Cézar? – Ela murmurou... Os olhos deles se iluminaram num sorriso.
Os dois se beijaram e a sua volta tudo se tornou um musical.
Um chafariz no meio da sala, fichas coloridas que voavam, uma linda canção de amor, e muitos, mais muitos bailarinos iam e vinham entre as estantes.
Ao fim do número Denise encarou seu amor e perguntou.
- Cézar com “z” ou César com “s”?
Anos mais tarde eles aprenderam. O amor se escreve com qualquer letra que se queira.

Marton Olympio

Marton é outro criador desta brincadeira fantástica, lá do Rio, que agora culmina aqui. bem vindo irmão!

Cadê Denise?

Um dia eu me revolto.
Pego a minha mochila e coloco mais um pouco de saudade.
Mudo o cenário da minha solidão.
Esqueço os problemas pequenos que insistem em ficar me aborrecendo.
Coisas que só servem pra eu ver que estou desperdiçando alegria.
Transformo futuro em passado.
Esperança em saudade
E pra quem fica deixo a pergunta.
Cadê Denise?


Denise Dantas

Cadê Denise? Ela está aqui neste maravilhoso poema! Sem ela nem existiria o EnContos vs PE.

Cadê Denise?

Admirando o vestido azul turquesa com detalhes rendados em marfim na vitrina daquela loja do centro da cidade, imaginando sua amada recheando o modelito foi que, pela primeira vez, percebeu que nada mais existia de seu passado ali. E a mente e ao coração veio-lhe a pergunta definitiva: Cadê Denise?

Pergunta que se fez, quase sorrindo, sabendo a resposta mais do que qualquer um na face da Terra. Desde quando resolveu assumir sua sexualidade, não mais como uma doença - que todos diziam que possuía - e sem medos – que sem querer nutria - ela sabia que enfrentaria preconceitos, questionamentos e lamentações.

Mas melhor encarar os fatos do que viver presa e infeliz. Viver uma vida que não era a sua. O que adiantara te vivido tantos anos agradando os outros e nunca se reconhecer em gestos, gostos e nem mesmo no espelho. Sentir-se culpada por se achar errada. Era dela o erro. Ela quem não se esforçava para ser normal. O mundo era correto e ela destoava.

Quando pequena, descalça pelas ruas do bairro, correndo atrás de pipas, jogando bola com a garotada, saindo na porrada com quem lhe encarasse, se sentia uma criança normal até que os vizinhos começaram a falar e sua mãe vendo em sua menina um moleque com joelhos feridos e tatuados por cicatrizes, proibiu-a de brincar na rua.

Encheu seu quarto com Barbies, Suzis e afins. Obrigando-a brincar de boneca. Mas as bonecas se beijavam entre elas. E quando começou a brincar só com meninas é que começou a se sentir atraída por elas. Não pelo mundo das meninas, mas sim pelos seus encantos, graças, beleza e sensibilidade.

Travou árduas batalhas internas. Queria ser normal, queria ser igual, queria não sentir o que sentia. Ou não era nada disso: queria ser assim mesmo, pois assim era o seu normal. Não queria ser igual. O que há de fascinante em ser igual? Queria sentir exatamente o que sentia, pois era um sentimento maravilhoso.

Sua família jamais acataria sua decisão. Não necessariamente por moralismo, mas por pudor perante a sociedade. O que diriam? Como reagiriam? Lembrava disso, quando contemplou duas jovens meninas passarem de mãos dadas, apaixonadas. Suspirou exclamando:” Como a sociedade mudou!”

Em sua época houve desmaio. Gritos. Choros. Acusações. Xingamentos. Ameaças. E tudo que só poderia derrubar alguém - tão dilacerada pela dúvida e pelo medo - como ela. Alguém que só precisava um pouco de apoio, para olhar a vida sem as lentes embaçadas e distorcidas do preconceito. Pobre criança.
Em seus 16 anos enfrentou o mundo e saiu vitoriosa. Pois o que aparentemente derrubar-lhe-ia, a tornou mais forte. Mesmo com todo o drama criado por sua família, sentiu pela primeira vez que respirava de verdade. Quando saiu de casa, olhou a rua com o mesmo olhar que a encarava quando ainda era uma criança. Com a mesma pureza que a liberdade pode oferecer a um pássaro recém solto da gaiola: possibilidades.

E o mundo então de fato se tornou normal, com suas dificuldades comuns, momentos felizes, decepções, conquistas, sorrisos, lágrimas, mas acima de tudo com o total poder sobre sua própria vida.

Olhou o espelho da loja e se perguntou: “Cadê Denise?” e sabia a resposta, por que hoje sim, de fato, ela passara a existir!

Cézar Ray
10 de maio de 2011

Cézar Ray as vezes sou eu, outras vezes nem sem quem é. No geral é um cara legal. Mas como vacila...

Cadê Denise?

Euforia. Festas. Glamour. Paqueras. Sexo. Banheiros.
A música estava alta, agitada. Ela desfilava mostrando o corpo. Exibindo-o. Desejando-se mais do que os comensais. Provocando vontades que endurecia e levantava a libido e o êxtase. Não era apenas o palpável endurecido que despertava ao vai e vem das danças sensuais. Os fluidos marcavam presença rolando com a gravidade, caíam como queda d'água, encharcavam as calças, as cadeiras e a mente.
A noite foi asmática! E asma, cigarros, bebidas e, uhm, exercícios físicos de grande intensidade não formam um conjunto que resulta em alegrias no dia posterior.
Fugiu. Sumiu. Cadê Denise? CADÊ DENISE?
Denise não se encontrava e nem se permitia ser achada.
...
Acordou. Feliz. Radiante. Tocou em seu corpo. Chorou. Tudo não passara de um sonho masoquista. Denise continuava presa em seu interior. E ali era puramente seu ser (sobre) vivente. O ser desregrado, inaceitável.
Perguntou: Ah, cadê a Denise?
E respondeu: Está aqui. É você, Denis. Apenas a cirurgia ainda não aconteceu.

Rô Gonzaga

Rô Gonzaga é vibração pura. Olhos e coração do EnContos. Seu blog: 
www.roneidegonzaga.blogspot.com espera e deve ser visitado por você, e por favor, comentemmmmmm!!!

Conceitos e preconceitos. (Cadê Denize?)

Os conceitos e os preconceitos podem variar sob a ação do tempo e do lugar. Foi sem querer, mas eu rimei!

Para muitas famílias que compunham uma sociedade arraigada nas tradições e nos princípios de uma época distante, aquela criaturinha não parecia ter nascido pra vestir o corpo de uma menina. Ela acordava muito tarde todos os dias, tomava o café da manhã lá pela hora do almoço e logo depois saia pra rua pra brincar com a turma mista, composta por meninos e meninas, todos com mais ou menos a sua idade. Só voltava horas mais tarde pra filar e engolir rapidamente o almoço e tornar a desaparecer das vistas dos seus, que nem se preocupavam mais com os sumiços da pestinha.

Durante as brincadeiras de “piquesconde” Denize era o alvo principal dos coleguinhas É que ela se escondia com tanta responsabilidade que só era encontrada quando se cansava de ficar sozinha em seu recanto preferido. Denize sempre foi mestra em se esconder. Escondia-se de sua mãe quando pressentia que seria convidada a colaborar na faxina da casa; desaparecia da sala de aula quando sabia que era a próxima a ir ao quadro negro prestar contas do que aprendeu durante a semana; sumia na hora de tomar remédios, banhos e de tudo que não era do seu gosto.

De tanto brincar na rua com a meninada do bairro, aprendeu a soltar pipas, nadar no ribeirão, caçar passarinhos e jogar pelada na rua e nos campos de futebol. Digo melhor, uniformizada. E foi como jogadora de futebol que Denize começou a despontar com notoriedade de atleta profissional. Dentro do campo ela nunca se escondeu, pelo contrário, era quem mais aparecia. Descoberta por alguns olheiros, foi convidada para assinar um contrato de gaveta com um clube da cidade vizinha. Depois de algumas partidas disputadas pelo campeonato regional, onde Denize se sobressaia em campo com excelentes atuações, mas ainda sem convencer a maioria dos dirigentes e torcedores do clube. Denize seguia evoluindo na sua nova profissão. Os inflamados torcedores, a maioria, tinham-na no mais alto conceito, acreditavam no seu potencial e diziam com absoluta certeza:
- Denize é um “vulcão em erupção” com a bola nos pés!

A outra parcela, preconceituosa em relação ao futebol feminino, e que ainda não tinha muita certeza das qualidades da atleta, desconfiada, afirmava:
- Qual nada! Denize ainda é uma “craka à toa”, que terá que aprender muito e poderá evoluir ou não! Só vai depender dela!

Em verdade, Denize, bastante mudada na sua maneira de pensar e agir, evoluiu tanto em tão pouco tempo que logo no primeiro ano de contrato profissional foi convocada para a seleção do seu Estado, cujo técnico era irmão do treinador dela em seu clube. Contudo, logo, logo, o que era bom durou pouco. Por não ter ainda amadurecido e adquirido total domínio sobre a maneira de se conduzir, após uma inconcebível recaída comportamental, no momento em que era preparada para o primeiro confronto a nível interestadual, Denize saiu furtivamente da concentração e desapareceu atraída pela noite bem iluminada de uma metrópole convidativa e repleta de atrativos perigosos. Só durante o café da manhã do dia seguinte, quando era feita a chamada nominal das jogadoras, o chefe da delegação, notando a falta da atleta hospedada no alojamento número dez, perguntou ao responsável pela segurança:

- Cadê Denize? Eu ainda não a vi hoje!

Como não foi possível responder à indagação do chefe, a jogadora foi cortada imediatamente e afastada do elenco quando já estava escalada pra sair jogando.

Assim que foi confirmada a ausência da atleta das instalações do hotel em que esteve até horas antes, e também para que a ordem fosse mantida, Denize foi desconvocada, retirada definitivamente do grupo e mandada pra casa. Ao retornar ao seu clube soube que o contrato que a vinculava à Agremiação que defendia, havia sido rescindido por motivos disciplinares.

Desempregada, envergonhada e arrependida pelo ato impensado que havia praticado, Denize passou a se esconder dos credores, dos ex fãs e, principalmente, de si mesma.


Gelson Maciel Amaral - gelsonmaciel@yahoo.com.br - Quarta-feira (04/05/2011)

Seu Gelson conheceu os EnContos por conta de Seu João, pai de Sil. Eram vizinhos, mas nenhum dos dois sabiam que tinham talentos ao seu lado. Os EnContos em Nova Iguaçu acontecem a duas casas de Seu Gelson. E com isso descobrimos uma das figuras mais dedicadas a literatura de Nova Iguaçu. Nunca falta. Participa de tudo. É uma honra tê-lo aqui em Recife!

Tarde demais para Denise?

Todos esperavam Léo e Denise para o almoço. Eles sabiam do horário. Era comum eles dormirem até mais tarde no sábado. D. Margot põe a última travessa de comida na mesa e, em seguida, berra mais uma vez para os filhos. Este era o único dia que eles almoçavam juntos. “Seu” Celso, era um homem austero e mal humorado. Não tinha muita paciência para esperar. Margot lhe fazia carinho, tentando contemporizar. Filho é assim mesmo, repetia ela, incansavelmente. Igor, o mais novo, e Alice, de doze anos, se entreolhavam de cara emburrada, mas eram incapazes de fazer algum comentário que aborrecesse o seu pai. Elas morriam de medo de suas broncas. Léo era o mais velho e vivia protegendo Denise, a adolescente problema. Dois eternos minutos se passaram. Celso respirou fundo, olhando feio para Margot e para o relógio da cozinha. Ela sabia que ele estava prestes a se levantar para ir buscá-los na marra. Nesse momento, Léo entra na sala muito nervoso, gritando:

- Denise não está em casa!!
Ouve um breve silêncio estarrecedor.
- Como ela não está em casa?? - Perguntou Celso, com um nó na garganta. Era como se ele soubesse que, um dia, algo assim pudesse acontecer. Denise sempre lhe causou problemas, apesar dela ter sido durante muito tempo a sua preferida. Mas, Celso, não costumava demonstrar muito bem as suas emoções - Já procurou em todos os lugares da casa? - insistiu ele.
- Já. Fui ao terraço, nos quartos, na garagem... ela não está em casa. A sua cama continua arrumada - Léo, já estava quase aos prantos.

O silêncio, mais uma vez, sufocou o ambiente. Denise não havia dormido em casa. Podia ser apenas irresponsabilidade de sua filha, mas, no fundo, Celso não acreditava nisso. Ela o provocava constantemente, mas nunca passara dos limites. De repente, a fúria e o pavor dividiam o mesmo espaço. Se Denise dormira fora de casa sem avisá-lo, ele não poderia prever a sua reação. Definitivamente, Celso, teria que tomar uma atitude à altura da provocação.

Alice começou a chorar. Igor, alheio ao que se passava, sentou-se à mesa e começou a comer as batatas fritas. Margot correu para o quarto da filha para pegar sua agenda de telefone e ligar para as amigas. Celso e Léo permaneceram estáticos, sem saber o que fazer.

Uma hora depois, todos estavam na sala aguardando notícias. Cada minuto era uma pontada no peito. Cadê Denise, cadê essa menina?? Murmurava Celso, sem parar. Não era justo.

A campanhia soa estridente. Celso levanta furioso para ir atender. Já estava imaginando levá-la para o quarto pelos cabelos e trancafiá-la pelo resto do dia. Isso, é claro, depois de umas boas palmadas e uma bronca sem precedentes.

Ele abre a porta com força e se depara com um policial segurando Denise nos braços, sem vida. O rosto de sua filha estava completamente desfigurado e sua roupa rasgada. Havia muito sangue em todo o seu corpo. Celso, não conseguia respirar. O suor escorria aos cântaros pelo seu rosto, enquanto um rodamoinho se formava dentro dele, dilacerando furiosamente todos os seus órgãos. Existia apenas uma dor lancinante. O policial sorria.

Ele não conseguia se mover. O sangue pingava na batente da porta. Aquilo não podia estar acontecendo. Sua visão foi ficando turva e escurecida.

Subitamente, um grito de pavor e remorso ecoa na escuridão. Margot entra no quarto, assustada. Sacode o seu marido até ele acordar. Celso estava molhado de suor. Olha em volta, e só então percebe que tudo não passara de um sonho. Apenas um sonho ruim. Estava aliviado e feliz por esta chance. Precisava levantar e ir ao quarto de Denise para abraçá-la com força. Talvez fosse só este abraço, talvez continuasse inflexível e rabugento com todos os filhos e com a sua esposa, talvez, talvez, talvez...

Não importa, ele estava feliz. Era um começo, e como todo começo, era difícil de prever o final.


Odervan Santiago

Odervan Santiago é do Rio e inaugurou comigo esta onda de escrever com tema. Não imaginava que ele iria se dedicar tanto nesta minha empreitada, agora, tão longe para reaviver o EnContos. E está super empolgado!

Hoje a noite não tem luar.

O relógio marca 23 horas e 2 minutos, estou na praia. Já é tarde, o movimento está super fraco. E aqui estou eu, como todos os dias, abraçado aos joelhos, sentado na areia.

Estou esperando ela... Mas hoje, ela não apareceu.

Logo hoje, que estava ansioso para ver a sua luz, seu encantamento... Apenas ouvindo o som das ondas do mar quebrando.

Todo dia é assim, na noite escura e silenciosa minha alma vaga nos meus pensamentos.

Penso nas coisas que deixei de fazer: nos livros que deixei de ler, nos cds que deixei de ouvir, nas viagens que acabei deixando passar, nos abraços que não dei, nas coisas que por ser tímido não falei, nas historias, que como um filme passam em minha cabeça e não escrevi...

Pois é, na ausência dela é assim, reconheço minha vida vazia, que somente quando estou com ela... ela que carinhosamente apelidei de Denise, consigo esquecer, esquecer não! Apenas, não lembrar.

Seu encanto é maior que qualquer problema. No meio deste vazio e escuridão, o meu inconsciente se manifesta, com um grito interno; silencioso; expresso apenas no olhar, me questiono: Cadê Denise?

Danúbia Oliveira

Danúbia é uma das gratas surpresas que acontece em minha vida de organizador de movimentos para tirar escritores das gavetas. Surpreendente Danúbia se revela uma poeta, escritora sensível que começa agora, mas que mostra que tem muito ainda para mostrar.