quarta-feira, 8 de junho de 2011

Tarde demais para Denise?

Todos esperavam Léo e Denise para o almoço. Eles sabiam do horário. Era comum eles dormirem até mais tarde no sábado. D. Margot põe a última travessa de comida na mesa e, em seguida, berra mais uma vez para os filhos. Este era o único dia que eles almoçavam juntos. “Seu” Celso, era um homem austero e mal humorado. Não tinha muita paciência para esperar. Margot lhe fazia carinho, tentando contemporizar. Filho é assim mesmo, repetia ela, incansavelmente. Igor, o mais novo, e Alice, de doze anos, se entreolhavam de cara emburrada, mas eram incapazes de fazer algum comentário que aborrecesse o seu pai. Elas morriam de medo de suas broncas. Léo era o mais velho e vivia protegendo Denise, a adolescente problema. Dois eternos minutos se passaram. Celso respirou fundo, olhando feio para Margot e para o relógio da cozinha. Ela sabia que ele estava prestes a se levantar para ir buscá-los na marra. Nesse momento, Léo entra na sala muito nervoso, gritando:

- Denise não está em casa!!
Ouve um breve silêncio estarrecedor.
- Como ela não está em casa?? - Perguntou Celso, com um nó na garganta. Era como se ele soubesse que, um dia, algo assim pudesse acontecer. Denise sempre lhe causou problemas, apesar dela ter sido durante muito tempo a sua preferida. Mas, Celso, não costumava demonstrar muito bem as suas emoções - Já procurou em todos os lugares da casa? - insistiu ele.
- Já. Fui ao terraço, nos quartos, na garagem... ela não está em casa. A sua cama continua arrumada - Léo, já estava quase aos prantos.

O silêncio, mais uma vez, sufocou o ambiente. Denise não havia dormido em casa. Podia ser apenas irresponsabilidade de sua filha, mas, no fundo, Celso não acreditava nisso. Ela o provocava constantemente, mas nunca passara dos limites. De repente, a fúria e o pavor dividiam o mesmo espaço. Se Denise dormira fora de casa sem avisá-lo, ele não poderia prever a sua reação. Definitivamente, Celso, teria que tomar uma atitude à altura da provocação.

Alice começou a chorar. Igor, alheio ao que se passava, sentou-se à mesa e começou a comer as batatas fritas. Margot correu para o quarto da filha para pegar sua agenda de telefone e ligar para as amigas. Celso e Léo permaneceram estáticos, sem saber o que fazer.

Uma hora depois, todos estavam na sala aguardando notícias. Cada minuto era uma pontada no peito. Cadê Denise, cadê essa menina?? Murmurava Celso, sem parar. Não era justo.

A campanhia soa estridente. Celso levanta furioso para ir atender. Já estava imaginando levá-la para o quarto pelos cabelos e trancafiá-la pelo resto do dia. Isso, é claro, depois de umas boas palmadas e uma bronca sem precedentes.

Ele abre a porta com força e se depara com um policial segurando Denise nos braços, sem vida. O rosto de sua filha estava completamente desfigurado e sua roupa rasgada. Havia muito sangue em todo o seu corpo. Celso, não conseguia respirar. O suor escorria aos cântaros pelo seu rosto, enquanto um rodamoinho se formava dentro dele, dilacerando furiosamente todos os seus órgãos. Existia apenas uma dor lancinante. O policial sorria.

Ele não conseguia se mover. O sangue pingava na batente da porta. Aquilo não podia estar acontecendo. Sua visão foi ficando turva e escurecida.

Subitamente, um grito de pavor e remorso ecoa na escuridão. Margot entra no quarto, assustada. Sacode o seu marido até ele acordar. Celso estava molhado de suor. Olha em volta, e só então percebe que tudo não passara de um sonho. Apenas um sonho ruim. Estava aliviado e feliz por esta chance. Precisava levantar e ir ao quarto de Denise para abraçá-la com força. Talvez fosse só este abraço, talvez continuasse inflexível e rabugento com todos os filhos e com a sua esposa, talvez, talvez, talvez...

Não importa, ele estava feliz. Era um começo, e como todo começo, era difícil de prever o final.


Odervan Santiago

Odervan Santiago é do Rio e inaugurou comigo esta onda de escrever com tema. Não imaginava que ele iria se dedicar tanto nesta minha empreitada, agora, tão longe para reaviver o EnContos. E está super empolgado!

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