quarta-feira, 27 de julho de 2011

Testemunha Ocular

Lá estava Erick olhando fixamente para a azeitona no prato. Certa vez ele foi visto abraçando um palmito em um bar de subúrbio, mas essa é outra história. “Coisas de maluco”, pensou. “Não!!!” Refez rapidamente o pensamento: “Coisas de apaixonado!!!” Antes de terminarem o aperitivo Suzana terminou com ele.

Simplesmente disse que não dava mais e foi embora, deixando-o sozinho, aliás, com a última azeitona do prato. Aquela azeitona o remetia ao passado. Quantos momentos felizes passaram juntos comendo aperitivos nos bares. Perdeu a conta das inúmeras vezes que dividiram uma porção de azeitona. Era um dos itens mais baratos do cardápio.

Suzana bebia muito mais que ele. Ela sempre voltava carregada para casa. Depois da Lei Seca, Erick parou de beber por causa dela. Amar é isso, justificava-se, fazer sacrifícios para o bem estar do outro. Suas lembranças sucediam-se num frenesi nostálgico. Aquela azeitona, ao mesmo tempo em que o levava ao passado, lembrava-lhe que tudo havia acabado. Era injusto. Estavam juntos há cinco anos e ele nunca desconfiou que algo estava errado. Não fazia tanto tempo assim que ela expressara o seu amor num quarto de motel, lhe presenteando com uma cueca vermelha de sex shop, daquelas com zíper e detalhes em couro. Quem, em vias de terminar um namoro, daria um presente desses? Ou seria exatamente o contrário?? Remoia Erick. Talvez, Suzana precisasse de algum estímulo adicional. Mas ela não podia imaginar que ele ficaria tão ridículo com aquela sunga. Vai ver que foi por isso que ela desistiu. Lamentava-se profundamente. Precisava parar de pensar nela. Estava se torturando e, francamente, ela não merecia.

Quando se deu conta, havia se tornado o centro das atenções no bar. As pessoas o olhavam penalizadas ao vê-lo debruçado sobre a mesa, ás lágrimas, conversando com o aperitivo. Respira Fundo, se recompõe e pede a conta. Lembra que ela ainda saiu sem pagar a sua parte.

Levanta-se encabulado diante daqueles olhares intrometidos e se detém por alguns instantes. Não podia deixar para trás a única testemunha ocular de sua decepção amorosa. Olha para os lados, como se estivesse prestes a cometer um delito e, aproveitando um momento de privacidade, numa ação digna de um ninja, enfia a azeitona no bolso e sai apressado. Poderia parecer estranho, mas ele e aquela azeitona ainda tinham muito que conversar.

Odervan Santiago
Rio de Janeiro - RJ

2 comentários:

Gerusa Leal disse...

Amei o conto. Redondinho feito uma azeitona :) Muito bom mesmo.

Beluska disse...

Fiquei com vontade de saber do papo dele com a azeitona... :D