Em 1986 Frank Miller recolocou Batman em seu devido lugar, como um dos heróis mais querido e respeitado do mundo, com dois clássicos dos quadrinhos: “O Cavaleiro das Trevas” em que tanto escreveu o argumento (sim, não sei hoje, mas os roteiros chamavam-se assim) como desenhou magistralmente o retorno do personagem, lá, já idoso e sem tanto acreditar no bom-mocismo, um Batman quase sem pudor. Até cruel. Um livro que marcou não só o seu retorno como também a minha volta ao mundo das HQs. Na sequência, com desenhos primorosos de David Mazzucchelli, escreveu “Batman: Ano Um”, onde ao contrário do “Cavaleiro das Trevas”, contou a história de como Bruce Wayne se tornou Batman. Pode ser considerada, também, como a Graphic Novel do comissário James Gordon.
Dois clássicos indiscutíveis desta fase tão profícua de Frank Miller.
Mas ninguém esperava que, correndo por fora, dois anos depois o roteirista eremita britânico Allan Moore ao lado do desenhista Brian Bolland trouxesse ao mundo outro “ano um”, mas não do herói e sim de seu arquiinimigo: O Coringa no clássico “A Piada Mortal”.
Usando também James Gordon como “coadjuvante principal”, a história gira em torno de seu seqüestro depois que sua filha foi baleada em sua própria casa, onde o vilão tenta provar que qualquer um, até o cidadão mais exemplar pode, de uma hora para outra, enlouquecer. Bastando para isso, uma sequência de infelicidades em um dia ruim.
Entrecortada por flashesbacks, contando seu próprio “dia ruim” onde descobrimos como tudo começou, onde e porque o comediante fracassado se tornou o vilão mais cruel da história do mundo dos quadrinhos e de onde veio todo seu ódio pelo vigilante mascarado.
Diferentemente de Frank Miller que usou uma linguagem cinematográfica para narrar suas histórias, Allan Moore se valeu da psicanálise, da filosofia e da literatura para construir uma história tensa, cheia de questionamentos que muitas vezes nos faz criticar a sociedade e a nós mesmo, humanizando o vilão e até criando aceitabilidade pelas suas idéias. Legitimando certas ações.
Cada vez mais, ao escrever no Zarayland resenhas de filmes ou livros me pego com uma vontade danada de revelar tudo de fantástico que encontro em suas nuances, mas me seguro, não quero estragar a possível busca de vocês, leitores, pelas obras narradas com paixão por mim e prefiro deixar que através desses textos que escrevo, vocês mesmo procurem e tirem suas próprias conclusões e saboreiem a obra plenamente.
A “Piada Mortal” é triste, contemplativa, violenta, questionadora, densa, agressiva, melancólica e emocionante. Lembro-me de fazer uma relação direta com umas das cenas finais do filme “Blade Runner” de Ridley Scott, onde o replicante interpretado por Rutger Hauer declama um lindo texto antes de ser extinto. Mais uma cena antológica que guardo com muito carinho dentro deste meu cabeção.
“A Piada Mortal” é um dos melhores quadrinhos de Allan Moore e por que não dizer de todos os tempos. Uma HQ que só veio a corroborar o encanto que Batman e seu universo continua a exercer até hoje. Uma obra-prima que merece ser garimpada, lida, analisada, admirada e curtida quadro a quadro.
Uma HQ que tirou definitivamente os quadrinhos da pecha de literatura menor e a elevou ao status de arte!
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