quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

Arthur Bispo do Rosário

Como toda pessoa que gosta e acha que produz arte, já caí na esparrela sem fim, de tentar explicar o que é ela de fato. Acho que todos nós somos acometidos por esta dúvida. Por que pode não parecer, mas tomar postura definitiva sobre ARTE é mais difícil que assumir religião, time ou partido político.

E não estou aqui para definições, pelo contrário! Vivo nesta lida, me embrenho na seara que acredito ser arte, mas não me atrevo a defini-la. Queria que este texto fosse escrito pelo André Eira ou pela Aline Corssais, mas o primeiro anda muito ocupado esculpindo majestosas esculturas para o próximo carnaval no barracão de alguma escola de samba do Rio e a segunda está de férias no Caribe. Sobrou para mim!

E fui escolher logo um “artista” que nunca foi “artista” ou sempre foi. Seu nome: Arthur Bispo do Rosário. Diga aí você, onde fui me meter! Assim que vi suas criações fiquei tão bobo e com tamanha inveja que nem me preocupei em saber quem era ele. Sempre acho que EU é quem deveria ter sacado, ou feito certa coisa primeiro. Eu quem deveria ter escrito tal texto, eu quem deveria ter feito tal pintura. Como se o mundo orbitasse em meu umbigo.

Quando soube da verdadeira história de Bispo do Rosário foi como se todas as discussões que já havia feito em mesas de bares, sobre arte, fossem por água abaixo! Por outro lado me libertei de muitos paradigmas sobre ela.

Arthur Bispo do Rosário jamais poderá ser definido ou catalogado nem como artista e nem como louco. Sua obra instintiva quebra tudo que já respeitei didaticamente. Desmonta o aprendizado acadêmico e me leva para outros lugares inusitados da alma. Depois dele, continuo admirando artistas como Raimundo Rodrigues, Deneir, Júlio Sekiguchi, Jarbas Lopez, entre outros amigos, mas alguma coisa se perdeu. Ou melhor, alguma outra coisa me ganhou.

Como é que uma pessoa se tranca durante sete anos em sua cela e produz uma obra tão bela e tão coerente? Como peças de uma sensibilidade extremada podem apenas ser objetos de uma paranóia? Como diferenciar o que foi gerado racionalmente ou “sensivelmente” e o que foi gerado com propósitos aquém da arte? “O que faço não é para mim e nem faço com gosto, faço porque sou obrigado. Porque este é minha missão e o sentido da minha vida”.

Nem nas maiores discussões sobre arte em nossas “Cervejas Filosóficas” no bar Raízes, alguma coisa foi tão poderosa assim. Que marchand, sem sabê-lo “um louco obrigado a registrar o mundo em miniatura”, diria que não há arte ali? Com traços sofisticados e vanguardistas?

Ok. Não estudei a sua vida nem sua obra para conhecer o que os estudiosos dizem sobre sua obra.

E não quero mais me aventurar por aqui...

Prefiro deixar para os verdadeiros críticos, porque eles sabem definir bem e discutir sobre Arte, eu não. Eu vou por outro caminho. Sofrendo, gargalhando, rindo, chorando em expressões indefinidas, que é o que sei fazer melhor.

O mundo com outros olhos. Desacostumando com o que aprendi. Exprimindo sentimentos e viagens sem qualquer tipo de sabedoria sem nunca provar se quer uma pitada de certeza. Somente experimentando o sabor da dúvida. Diferentemente de Arthur Bispo do Rosário!

Arthur Bispo do Rosário II

Sergipano de Japaratuba, apesar de oficialmente ser de 1909, provavelmente era de 1911. Era comum a omissão da idade real para se passar por mais velho e assim ingressar nas Forças Armadas.

Arthur foi para o Rio de Janeiro e virou marinheiro (marcante passagem que o fez conhecer muitos países e é a referência mais presente em sua obra) e depois trabalhou na Light e em “casas de famílias”.

Na noite 22 de dezembro de 1938 disse ao patrão, o advogado Humberto Magalhães Leoni que iria se apresentar à Igreja da Candelária, pois era “O Salvador”. Peregrinou pela rua Primeiro de Março e por várias igrejas do centro do Rio. Por fim subiu ao Mosteiro de São Bento e anunciou aos monges que era um enviado de Deus e que viera para julgar os vivos e os mortos no dia do Juízo Final.

Fichado e preso como louco, foi enviado primeiro ao Hospício dos Alienados da Praia Vermelha e transferido, um mês depois, para a Colônia Juliano Moreira em Jacarepaguá sob o diagnóstico de "esquizofrênico-paranoico” onde passou mais de 50 anos internado se recusando a ser medicado até a sua morte.

Um dia resolveu se trancar em sua cela e realizar o que “as vozes o mandavam”. Recriar o mundo, ou registrar o planeta em miniatura, o que fez com árdua determinação durante sete anos.

Foi revelado numa matéria para o Fantástico em 1980 pelo jornalista Samuel Wainer Filho (filho do célebre fundador do Jornal Última Hora, Samuel Wainer e da colunista Danuza Leão e criador da Rádio Fluminense “A Maldita” com Luiz Antônio Mello) que faleceu, ainda, antes de Bispo, em 1984 num acidente de automóvel.

A partir daí Bispo passou a receber visitas de estudiosos, que descobriram na loucura de sua obra, um universo artístico tão rico e incomum que passou a ser respeitado como um dos principais artistas de vanguarda de nossos tempos. Ainda assim, sempre se recusou a sair da colônia.

Uma de suas obras mais emblemáticas é o seu “Manto da Apresentação”, que deveria ser usada por ele no dia do Juízo Final, uma entre tantas peças que figurou como estrela principal da 30ª Bienal de São Paulo entre tantas exposições pelo Brasil e pelo mundo.

Arthur morreu em 1989 sem nunca aceitar o título de artista. Morreu como um enviado de Deus, satisfeito por ter cumprido a missão que lhe fora designado!

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